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Está muito boa a edição de dezembro do Le monde diplomatique Brasil, com uma série sobre consumismo.
"E de pouco adiantarão leis que coíbam a publicidade dirigida ao público infantil, se os próprios adultos, entregues ao consumismo e à cultura da vaidade, forem às compras, motivados e seduzidos pela imagem que seus filhos, destinatários dos presentes natalinos, terão diante de outras crianças." (Yves de La Taille, "Consumismo infantil", p. 4)
O autor desta frase é professor de psicologia da USP, e seu texto partiu do fato de que hoje se discutem formas de regular em lei a publicidade voltada ao público infantil. As crianças são psicologicamente vulneráveis ao apelo da publicidade e à figura dos heróis ou personagens prediletos. Mas, no fundo, o que leva aos absurdos do consumismo infantil é mesmo a falta de maturidade dos adultos para lidar com o tema. Estamos dispostos a enfrentar essa questão?
"Aquele cara embaixo da ponte não sou eu. Aquele pedindo esmola também não. Aquela senhora desempregada muito menos. Eu não. Eu tenho a oportunidade, se puder comprar um caminhão passo por cima da Pick-up, se puder comprar uma Pick-up passo por cima do Palio, se puder comprar o Palio passo por cima da moto, se puder... Mas ainda não posso." (Ferréz, "Sobre pássaros e lobos", p. 5)
Este segundo texto foi escrito por um autor que conhece bem a periferia onde vive e de onde escreve. Mostra como a lógica do consumo mantém girando uma engrenagem que, ao fim de tudo, termina moendo os próprios consumidores, especialmente os pobres. Depois de constatações deprimentes sobre como as pessoas viciam no consumo e compram esta ideologia que os massacra, Ferréz conta uma linda parábola - um ninho de passarinho encontrado no fundo do quintal o faz pensar: "isso eu não comprei, isso eu não paguei, nem parcelei, muito menos achei num shopping, nem tive que roubar, isso veio de graça, e acho que isso que é a vida."
"A febre de comprar nos faz pensar, como sugeriu Lipovetsky, que "ela seja uma compensação, uma maneira de consolar-se das desventuras da existência, de preencher a vacuidade do presente e do futuro". O frenesi das compras então funciona para nossa longa solidão egóica como "simulacro de aventura", o fantasma da obra, pequena loucura cotidiana, a prótese do prazer." (Gustavo Barcellos, "A alma do consumo", p. 6-7)
O autor deste texto é psicólogo e escreveu um livro sobre Jung. Explica os mecanismos psicológicos arrasadores que esta lógica do consumo está operando. Mostra claramente que o consumismo é uma patologia severa. Que se desdobra em sintomas tão comuns como: "depressão, paranóia, compulsão, baixa auto-estima, competitividade extremada, pânico, suicídio, solidão, medo, estresse, sintomas psicossomáticos, hiperatividade, hipercosumismo. Vulnerabilidade psicológica, desetabilização emocional."
Tudo passou a ser consumo. O prazer, o lazer, as relações humanas. As necessidades básicas. Aliás, quem consegue saber hoje o que é necessidade e o que é supérfluo? Vivemos no mundo do supérfluo onde, no limite, somos nós mesmos supérfluos.
Alguém aí está disposto a tentar parar esta engrenagem?
Tudo isso me faz lembrar do que o Tuco escreveu sobre o vento.
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3 comentários:
É...
Estamos enfiados nessa até o pescoço. ..
Dizem que 2009, mesmo com a 'crise', será o ano de maior consumismo na Argentina.
Os hermanos passarão o ano inteiro con su mismo carro, con su mismo par de sapatos...
:-P
Não estou muito diferente deles.
Apesar de estar na melhor condição financeira que já tive na vida, tenho tantas pendências a resolver que continuarei com o mesmo carro, as mesmas calças, os mesmos sapatos.
Acho que o Brasil não está muito melhor que a Argentina...
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